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sábado, 9 de agosto de 2008

Zona Leste - Vila Verinha - "Reinaldo"

No final da década de 50, mais precisamente no ano de 1957, quando nos mudamos para o bairro, recém fundado, poucos eram os habitantes do lugar. Algumas casas se escondiam em meio às matas; A trilha era o caminho a ser seguido. Tudo isso dava a Vila Verinha, um certo ar de perigo e mistério, que sem dúvida, foi causa de tantas inspirações.


Na época existiam dois empórios: Do Manezinho que ficava localizado no alto da rua lº de Maio com a Rua Abílio Nascimento e; Bar do Lídio Peixoto, que ficava na baixada da mesma lº de Maio, à beira da ponte de madeira. Era neste local que meu pai Júlio Marinheiro tomava seus tragos junto aos pais de meus amigos.

Os adolescentes, assim como eu, formavam grupos (turmas) divididos por faixa etária. Os líderes na maioria das vezes eram escolhidos por afinidade. No bairro existiam diversos grupos. Não como os que infestam as grandes cidades atualmente, onde o lema é a violência; Eram sim, grupos de companheiros e o que prevalecia era a amizade. Todos participavam das mesmas brincadeiras de rua. Aos domingos festas, bailes, cinema e o “footing”. Esses eram os nossos divertimentos preferidos. Se houvesse alguma encrenca (briga) com um dos membros, aí sim, “0 páu comia”. Quem pudesse mais chorava menos. Só, que eram brigas limpas, sem apelação de facas ou revólveres. Os mais violentos no máximo apelavam para o "balaústre", madeira muito usada na época para cercar as residências. Dessas,se originavam apelidos, como “Mela-Côco”, por exemplo.

Entre as turmas que existiam vou tentar retratar algumas das mais atuantes, "Aos amigos que por ventura, lerem esta coluna e quiserem se manifestar, poderão fazê-lo e, comigo, corrigir algumas falhas, que por força de memória eu venha cometer".

A minha querida Vila Verinha viu nascer algumas das turmas mais unidas na época: A turma do Reinaldo (Eriovaldo de Castro): Turma do “Bunga”; Turma do “Cartouche”; Afora estas três, existiam ainda: Turma do Bolinha; “Irmãos Metralha”, Turma do Caveira, etc...

Reinaldo Filho de Dona Alice que fazia doces em formato de aves como galos águias e outras além das chupetinhas de açúcar que era a maior festa da molecada. Reinaldo era um garoto muito engenhoso, tinha conhecimento em carpintaria, liderava um grupo de garotos na faixa de dez a doze anos. Juntos construíam pequenas casas de madeiras, que eram usadas para encontros e reuniões da turma.

Durante a semana, todos da turma trabalhavam “duro”, catando papéis, ferros-velhos, engraxando sapatos, até mesmo estercos de cavalo; Para tudo havia comprador. Não posso deixar de lembrar, que todo o dinheiro conseguido era entregue nas mãos de nossas mães. Apenas uma pequena parte nos era repassado nos fins de semana.

O domingo era o grande dia: Todos nos reuníamos na esquina para juntos, irmos ao cinema, assistir a continuação do seriado da semana anterior. Era o maior sufoco; Pois o mocinho (herói do filme ), ficava a maior parte do tempo em perigo quando o episódio terminava.

Naquele tempo havia três cinemas em nossa cidade: Fênix; João Gomes e; Cine Presidente, que era o mais novo. A gente precisava até usar sapatos para entrar! Sem sapatos não se podia ir ao cinema naquela época. Isso, não Ju nada fácil. Mas tudo era uma questão de inteligência e organização. Momentos antes de chegarmos no cinema, Reinaldo já coordenava uma estratégia: Aqueles que tinham sapatos emprestavam um dos pés para os que não tinham; A ordem era todos entrarmos “mancando” como se estivéssemos com um dos pés pé machucado sem poder calçar. E assim íamos entrando um a um, cada um com um pé de sapato.

Aquilo para nós era uma festa, pois mais uma vez havíamos conseguido "enganar" o porteiro e o fiscal. Hoje fico imaginando o que eles falavam, um ao outro, depois de nos deixarem entrar; pois é claro, que êles percebiam a nossa trama. É...Aqueles dois...Eram bons sujeitos afinal.

Ao término da sessão a gente começava a viver as aventuras dos nossos ídolos do cinema. Ao chegarmos em casa, o primeiro compromisso era irmos à casa de Reinaldo, para combinar uma batalha de revolver e espingarda (de brinquedo é claro). Formados os grupos adversários, íamos ao sitio do Akira, um dos colegas, lá então, fazíamos o palco das batalhas. Rauzinho era o banqueiro, já que ele possuía pacotes de cédulas de dinheiro de papel que vinham dentro do pacote de café.
Reinaldo logo desenvolveu habilidade com o violão d'onde extraia belas melodias as quais ensinava aos meninos mais aguçados, tais como Adãozinho, Zeringué, Adelino Moreira Oswaldo Japonês e outros.

Assim crescemos felizes, sem tomar-nos consciência da pobreza em que vivíamos. Ajudados pela falta de informação, não tínhamos conhecimento das coisas maravilhosas que o dinheiro poderia oferecer, por isso, ninguém sofria por não poder desfrutá-las.Como disse certa vez o poeta e filósofo Chico Buarque " Pior do que passar necessidade, é passar vontade das coisas" .

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