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sábado, 9 de agosto de 2008

AS ANTIGAS BRINCADEIRAS DE RUA



Vila Verinha - As brincadeiras preferidas

Como eu já havia dito no número anterior, os meninos pobres da Vila Verinha, e de todos os bairros também, não tinham o acesso aos brinquedos sofisticados. Por isso, tinham que inventar e construir os próprios brinquedos, o que lhes garantiam o desenvolvimento da inteligência.

Na Vila Verinha, a imaginação corria à solta: carrinhos de madeira, verdadeiras réplicas dos caminhões da época, com molejo e tudo, Pipas; Espadas (de madeira e até de ferro); Espingarda nisto, os mestres eram: Tidinho e Escamoso. Para caminhões enormes de madeira, com cabine e direção, o mestre era "Bunga"

Mais numa tentativa de preservar parte do folclore da Vila Verinha, para que de alguma forma fique registrado, tentarei descrever algumas das brincadeiras coletivas, que faziam a festa da garotada na época.

Antigamente, não existiam desocupados mas sim desempregados, pois todos os garotos tinham que trabalhar para ajudar em casa. Somente uma parte muito pequena da féria, cerca de 15%, é que ficava com o garoto, que deveria ir juntando para a “matinèe” do domingo.

Existiam muitas formas de se ganhar dinheiro na época, como por exemplo: catar papéis velhos; ferros-velhos; garrafas; engraxar sapatos; pegar lenha nas matas; esterco de cavalos para hortas e; também os trabalhos sazonais na roça, como: colher algodão, chacoalhar e bater amendoim, que eram os mais comuns na região.
Hoje ao pessoal da cidade que executa este trabalho dá-se o nome de bóia-fria.
Tudo isso, durante o dia, porque, quando a noite chegava....
Por volta das 20,00 horas, as nossas mães se reuniam de frente alguma casa, geralmente as casas tinham um grande banco de madeira à beira da cerca. Ali ficavam conversando, enquanto as filhas, brincavam na rua, sempre às suas vistas.

A esta altura, Reinaldo, Tidinho, Adão, Paçoquinha, Cido Buica, Tacica, Butininha, Paulindinho, Oscar Zira, Irineu, Dirico, Pita Flor, Zeringué, Pedro Roso, Formigão, Valdemar Cameiro, Paulo Preto, Lelé, Irineu, Akira, enfim, todos já se encontravam na esquina do Józa (Jozafá).
Meia hora depois, pronto,já estava escolhida a brincadeira do dia e os times formados.
A brincadeira predileta, era o "Salvo"; uma brincadeira que exigia muita agilidade, no que se destacavam Adão, Tidinho, Paçoquinha.

O "Salvo", se consistia em dois times, que de acordo com o "par ou ímpar" um deveria caçar e outro se esconder. A medida que os garotos fossem pegos (para isso, havia a necessidade de se agarrar o adversário e bater três vezes nas costas). Estes, formavam um cordão humano, ligados pelas mãos a um poste de iluminação. Estes elementos seriam "salvos" quando um companheiro, mais ágil, furasse o bloqueio e relasse em um dos companheiros do cordão, assim, todos fugiriam e a caçada começava novamente. Caso contrário, se todos fossem capturados, a situação se revertia.

Havia muitas outras brincadeiras, como "Palha ou Chumbo" que se consistia em dois times, que disputavam no "par ou impar".
Os elementos do time perdedor, deveriam ficar agarrados uns aos outros pela cintura, de cabeça abaixada, formando um cordão humano sendo que o primeiro elemento, ficava seguro em um poste de iluminação para dar sustentação.
O time vencedor do par ou impar então, comandados pelo líder, (que deveria conhecer profundamente os elementos de seu time) escolhia quem deveria saltar primeiro, pois deveria ser sempre os mais ágeis e leves, para que saltassem bem a frente, para assim caber os demais elementos. O detalhe é uma vez montado, da forma em que caísse, o elemento que saltou deveria permanecer, sem se mover. Devagarinho alguns começam a escorregar e quase sempre iam ao solo, quando então, a situação se invertia. Enquanto estivessem em cima, montados nas costas dos adversários, deveriam perguntar aos mesmos num coro:
- Palha ou chumbo?
Se o peso não fosse insuportável, estes responderiam:
-Palha!
Assim ficariam até que alguém se desequilibrasse e caísse ao solo. Ou então, quando se perguntasse: Palha ou chumbo? O peso estivesse demais, ou ainda o líder da turma de baixo percebesse que o time de cima está bem acomodado e provavelmente ficariam muito tempo em cima, responderia:
- Chumbo!
Então começava tudo de novo.
Como podemos ver esta era uma brincadeira, que iniciaria talvez a formação de possíveis técnicos esportivos.

Tinha também, a brincadeira da "Mãe da Rua".

Esta era uma brincadeira para valentes. A "mãe da Rua" era um elemento que tinha a posse da rua, enquanto os demais, a posse das calçadas. O pessoal das calçadas deveria ficar atravessando a rua, pulando em um só pé, enquanto o elemento da rua, deveria agarrar estes, e forçá-los a pôr os pés no chão, quando então, este elemento passaria a fazer parte do time da rua. Valia até, invadir a calçada para puxar os donos das mesmas, mas se fossem agarrados por estes, seriam castigados com tapas fortíssimas nas costas, e só estariam protegidos se retornassem à rua.
À medida que os donos da calçada fossem pegos, tornaria o trabalho da mãe da rua mais fácil.
Assim a brincadeira continuava até que não restasse mais ninguém na calçada. Sempre tinha aqueles que choravam. Quase sempre havia um entrevero entre os participantes.

Outra brincadeira apreciada, era a "CINTA".
Esta, se brincava da seguinte maneira:
Era escolhido o "Pai da cinta", que segurava na fivela da mesma,
enquanto os demais, a outra extremidade. O pai da cinta perguntava:
-Quero o nome de uma fruta que começa com "M".
- Manga
Respondia um:
- Maçã!
Respondia outro.
Se fosse esta a fruta imaginada, O pai da cinta liberava a mesma ao acertador, que saia desferindo cintadas nos colegas com toda a força. Era uma correria só. Mas este, não poderia se empolgar muito e se afastar demais do pai da cinta, pois a qualquer momento, este gritaria:
-Orelha! Orelha!
Que significava que o portador da cinta deveria voltar imediatamente à presença do pai da cinta e não poderia esquecer de dizer o nome da fruta que lhe dera a posse da mesma. Caso ele fosse agarrado, seria arrastado pelas orelhas por todos os outros, principalmente por aqueles que tivessem levado cintadas. Muitas vezes, as orelhas sangravam, tanta era a violência. Ou ainda se eventualmente esquecesse o nome da fruta, seria castigado da mesma forma até se lembrar. Claro! Ia “chutando” diversos nomes de frutas até acertar, quando então seu castigo cessaria.

Tinha também, "0 FIM".
Uma pessoa era escolhida para ser o Fim. Os demais ficavam a sua volta.
O fim ficava de posse de um chinelo (era sempre escolhido o mais duro e pesado), que seria usado por todos os participantes da roda, para castigar os perdedores. Todos os participantes deveriam adotar o nome de uma fruta. O fim então, iniciava a brincadeira dizendo:
- 0 Fim passou aqui a fim de comer maçã!
O indivíduo que adotara o nome de Maçã, imediatamente deveria se manifestar:
-Maçã não!
O Fim rapidamente perguntava:
-Quem
-Manga!
Jogando para outro garoto a brincadeira, devendo ter sempre o cuidado de indicar uma fruta que estivesse no jogo.
-Manga não!
-Quem?
-Pêra!
-Pêra não!
-Quem?
-O Fim!
-O Fim não!
-Quem ?
-Mexerica!
Vejam que neste caso, se o próprio "Fim" titubeasse, também poderia levar uma chinelada com toda força na palma da mão, por cada um dos participantes da brincadeira. Esta brincadeira, ajudava o desenvolvimento dos reflexos e da atenção. Os garotos mais lentos apanhavam muito.

Mas nem tudo era violência. Tinham também, as brincadeiras mistas, onde participavam meninas, como passa anel, pé-na-lata lenço-atrás, Bétis( Uma espécie de “Basebol” que tinha uma casinha de varetas que o lançador deveria derrubar); Queimada (Semelhante ao “Handebol”), Balança-Caixão( Balança caixão... Balança você... Dá um tapa na “bunda” e vai se esconder!); Mês; Pique ; Uma na mula (semelhante ao salto ao cavalo) e; outras.

Assim, eram as noites dos meninos da vila Verinha durante a semana, enquanto aguardavam o grande dia de "Domingo".

Um comentário:

O EMBAIXADOR disse...

Aquelas brincadeiras ajudavam no desenvolvimento diciplinar e de liderança. Além do desenvolvimento do espírito coletivo e social. Embora um tanto rudes, mas preparava a criança para os diversos problemas que eram próprios da formação infanto-juvenil.