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sexta-feira, 18 de novembro de 2016

A Saga de Bunga

02-12-2009- Sebastião Fontes recebendo das mãos de Eduardo Chezzini( Gringo) o Troféu de Honra ao Mérito por sua importante participação no Carnaval de Presidente Prudente

 A Vila Verinha, foi  berço de muitos personagens que marcaram presença no cenário cultural e esportivo de Presidente Prudente. Verdadeiros heróis!  Pois numa época em que tudo era difícil, onde o mais comum, era vermos as pessoas se acomodarem e simplesmente esperar a vida passar, tinham aqueles que se valendo da criatividade, aos "trancos e barrancos", improvisavam alguma atividade visando o entretenimento de seus iguais.

Bunga  recebe das mãos do Presidente do Tênis Clube Homenagem pela sua participação em prol do 
                             
                    A SAGA DE BUNGA

 O  GAROTO 
                   Dentre estes heróis, vamos falar um pouco de "Bunga" filho de D. NESTINA.
                  Bunga, cujo nome é José Fontes, tinha fixação por brinquedos grandes. Seus trenós de grama, (brinquedos parecidos com patinetes de rolemãs, mas que ao invés de rodas tinham dois trilhos de madeira bem lisos), sempre cabiam quatro ou cinco garotos, enquanto dos outros, só cabiam o piloto.
                  Os patinetes de rolemãs de "BUNGA", eram exagerados, transportavam vários garotos, mais pareciam composições ferroviárias, com vários engates.
                  Até os papagaios (pipas),tinham que ocupar mais de uma pessoa para empinarem. Eram tão grandes, que precisavam de linha de sapateiro para suportar a força, sendo necessária uma pessoa apenas para enrolar a carretilha que mais parecia sarilho de poço. Quando "Bunga" ia soltar papagaio sempre juntava uma multidão à sua volta. Ele fazia o pipa sumir nas nuvens. A curiosidade maior era quando o mesmo era recolhido, não sei se era verdade, mas o pipa chegava desbotado, causado pela umidade das nuvens, afirmavam os mais "entendidos".
   Certa vez ele construiu um caminhão de madeira, medindo aproximadamente quatro metros de comprimento. Era uma réplica do FNM ou ''fenemê'' como costumávamos chamar. Tinha uma cabine, direção e freios. Na cabine ele conduzia o "bruto", e ao seu lado, um privilegiado qualquer, que a seu critério escolhia para acompanhá-lo, enquanto os demais garotos empurravam o caminhão até o topo da ladeira.
                 - Atenção! Devagar... Já!!!
                 Todo mundo rapidamente pulava na carroceria do "baita" e na maior algazarra, fazendo com que os moradores ao longo da rua saíssem de suas casas para ver o que estava acontecendo. Tinha tanto moleque montado no caminhão, que era quase impossível identificar o objeto que os transportava. Ao perceberem o que estava acontecendo, aqueles  moradores ficavam assistindo, sempre duvidando que o mesmo conseguisse efetuar as manobras na curva abaixo. Quase sempre "Bunga" conseguia. Mas quando não dava? Era só moleque que voava para todo lado, numa gritaria infernal e o brinquedo fatalmente iria parar dentro de alguma ribanceira, ou  bater contra um barranco;
               Depois de uma rápida vistoria, caso o caminhão não tivesse sofrido nenhuma avaria importante e apresentasse condições de uso:
               - Vamos de novo!
               Determinava o líder.
               "Bunga" era assim mesmo. Não conseguia imaginar uma brincadeira, que não fosse coletiva.
                                                         O ADOLESCENTE
                 Em meados da década de 60, “quando a “Brinc-dance” era o “ it” do momento, já não se usavam barracas de bambus para se fazer os bailes, bastava alguém dar a idéia e pronto: já estava marcado o endereço da próxima brincadeira dançante.
                  Era o auge da "Sonata"  (toca discos que fazia sucesso entre os jovens da época). Quase todos possuíam uma. Assim qualquer um  poderia realizar um baile em sua casa.
                  O Problema, eram os pais, que faziam tantas restrições que quase sempre inviabilizavam os projetos da maioria dos garotos e meninas,  uma vez que esses bailes eram realizados nos espaços da sala da casa e qualquer pessoa podia adentrar, independentemente de se conhecer ou não o dono da casa. Mas era assim que tinha que ser, pois caso contrário haveria encrenca.
                 Um belo dia ao visitar Bunga, o que vejo?
                 Nada mais nada menos que Bunga e seu irmão César(Sebastião Fontes)que o apoiava em todos os seus projetos, escavando por baixo da casa de sua mãe, que era de madeira com um desnível para os fundos no terreno, fazendo uma espécie de porão.
Escora daqui, escora dali, Levanta a parede de tijolos ( Cesar tinha feito um curso de pedreiro), e vai daqui, dali e pronto!  A Vila Verinha já dispunha de uma das primeiras "Discotecas" de Presidente Prudente.
              Bunga Inventou uma bola de isopor coberta de espelhos que girava e uma lâmpada com seu foco de luz  direcionada para ela dando aquele efeito de luz nas paredes do salão.
              A inauguração foi coisa de cinema. Tinha tanta gente, que ninguém conseguia suportar o calor que fazia lá dentro. E  quando a gente saia para respirar um pouco, perdia a vaga. 
              Só sei dizer que foi um sucesso total!   
               O interessante é  que mesmo depois de tantos anos, Bunga ainda conserva este gosto ;  pois até hoje*, ele realiza essas  brincadeiras dançantes  em sua casa. O mais importante:  Sempre atualizado nos ritmos.  Ao gosto da garotada.
O que dizer de uma pessoa desta?
O SAMBISTA
              Voltando um pouco no tempo, por volta de 1958,   lembramos de Dona "Nestina", mãe de Bunga.
              Dona Nestina era uma mulher muito alegre e festeira e quase sempre promovia bailes em sua casa. Talvez por isto, "Bunga" tivesse adquirido aquele gingado e conhecimento musical.
                Dotado que era de extraordinária criatividade,  Bunga fabricou um instrumento de percussão (surdo), utilizando-se de um tambor de carbureto (produto utilizado em soldas) e uma pele de cabrito que fez grande sucesso. Tanto, que logo seus amigos se interessaram e seguindo suas orientações também fizeram seus instrumentos. A partir dai, o grupo passou a realizar sem nenhuma pretensão, batucadas nos fins de semana, às sombras dos pés de pinhão, que cercavam a casa do "Seu" Vicente, marido da Dona Glória, e de Zé Cachoeira marido de Dona Izautina( benzedeira) na chácara do "Albertão"(Alberto Artoni).
                O grupo já estava bem afinado, e em virtude de Bunga estar sempre assoviando, Dona Nestina  sugeriu que o conjunto se chamasse "Bico de Ouro" era assim que ela costumava brincar com ele. A sugestão foi aceita por todos.
                 Talvez pela facilidade de se encontrar o material necessário para o fabrico de instrumentos, já que na vila morava "Seu" Raul dos carneiros e ainda o pai do  Ademar Silva( Demá Carneiro), que criavam e matavam muitas cabras para vender as carnes, sendo que as peles por não ter valor comercial na época eram jogadas fora. Além disso, em qualquer oficina poderiam ser encontrados os tambores de carbureto, que eram usados na confecção dos instrumentos de percussão.   Conta José Pena ( primo de Bunga), que era muito garoto na época, mas se lembra que eles tinham uma estranha técnica de curtimento de couro. Primeiro, enterravam as peles cobertas por um produto branco, que hoje ele acredita ser cal; depois de algum tempo, eles desenterravam estas peles e raspavam os pelos, para depois então secá-las.
                A Turma foi crescendo de tal maneira, que eles resolveram fundar uma escola de samba.
Liderados pelo mestre "Bunga " , os amigos "Macalé ", Tião Fundador, Paulo "Beiço de ferro", "Rafa", "Bé", "Luizinho", "Jorjão"(Jorge Marcelino); os irmãos Nelson e Otacílio, "Santão", "Lindo Flor", Néo (Valdecir dos Santos) /Valdemar "Pantera" , "Dito da cuíca",Ângela que veio a ser esposa de Bunga,  Isaura Pena (que foi a primeira Porta-Bandeira de Presidente Prudente); além, de muitos
Mestre Sala Eusidinei dos Santos 
Porta Bandeira Maria Ap. Zanelli 
outros, fundaram a Escola de Samba "Bico de Ouro", sendo a primeira a desfilar pelas ruas de nossa cidade.
                   O sucesso foi tão grande, que a escola, tinha que desfilar dentro de um quadrilátero de cordas, que sustentado por membros da comunidade, protegia a escola da platéia que se aglomerava ao longo das ruas, por onde o desfile transcorria e as pessoas empolgadas pelo som, queriam se juntar ao grupo para sambar com as cabrochas.
                   Me lembro, que segurar a corda de isolamento era uma honra.
                  Os instrumentos mais comuns na época eram: Reco-reco, agogô, cuíca, apito, pandeiro, maraca, tamborim, surdo, contrassurdo e frigideira. Muitos destes instrumentos, a maioria da população da cidade, desconhecia. Quem poderia imaginar que uma simples frigideira de cozinha, pudesse dar um show?  É... Mas dava. O ritmista batia com ela no asfalto, intercalando com as batidas da baqueta, e isto dava um efeito todo especial. As garotas rebolando, passistas sambando. Era demais!!!
                  A partir dai, nunca mais, o carnaval de rua de Prudente, foi o mesmo. Pois todos os anos, o povo já esperava pelo desfile da Escola de Samba "Bico de Ouro”, que passou a ser a principal atração do carnaval da cidade. Isto fez  com que, outras agremiações, fossem surgindo posteriormente. (Melhores detalhes, somente os "maiorais" da "Bico de Ouro", poderão contar. Por isso, abrimos espaço aos fundadores e atuais diretores, para que façam deste informativo, os anais de sua história.
1978 - João Fornalha- Bunga - Marinheiro
                  Posteriormente, Bunga, veio a se afastar da “Bico de Ouro” e só após muitos anos, voltou a participar de escolas de Samba, desta vez, como diretor de bateria da "MANDRAKES", só parando, alguns anos depois, quando, acometido que foi por forte nevralgia, Impossibilitando-o de conduzir a bateria, já que na época, o apito era fundamental para a função.
                 Hoje, são usadas as batutas para se comandar as baterias, mas permanece em nossos ouvidos, o som dos apitos que era um show à parte. Quando hoje, vejo um diretor de bateria com sua batuta, me vem a imagem orgulhosa de Bunga com seu apito. 
·          Esta crônica foi publicada pela 1ª vez por este autor,  no ano de 1998 pelo Jornal “A voz do Samba” de Pres. Prudente.  Bunga faleceu no dia  17.07.2010
                                          

                                                                    fim



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